sexta-feira, 26 de março de 2010

Mentes criminosas: Capítulo 3 - Olhos azuis de plástico

Capítulo 1 - O quarto


Capítulo 2 - Uma voz no silêncio



Capítulo 3 - Olhos azuis de plástico


"Obrigada por me libertar, minha cabeça já estava pesada.", ironizou ela.
Primeiramente Marcos se sentiu idiota, mas depois admitiu a si mesmo que fora um plano genial. O tempo todo, a vítima era quem estava por trás de tudo. Decidiu falar:
-Se eu não temesse levar um tiro, te aplaudiria agora mesmo.
-Bom você levará um tiro de qualquer forma... Então, se quiser aplaudir, fique à vontade.
-Como?
-Bem...
-Não, eu não estou falando disso. Eu sei que essa mochila não está aqui de enfeite, há algum explosivo nela, provavelmente uma bomba de curto alcance, o suficiente para mandar nosso velho homenzinho pro espaço. E eu admito que deve ter sido complicado se prender ali em cima, mas nada que algumas aulas de contorcionismo não pudessem dar um jeito. Também sei que ele acertaria a jaula, claro que sei, o nosso senhor Moisés é um dos melhores atiradores que tive notícias. Não estou falando disso. Tampouco estou falando de um leão estar nesse quarto, algo impactante é verdade, mas eu já presenciei coisas mais peculiares, se me permite dizer. O que eu realmente queria saber é como você não percebeu? - Mesmo de costas, ele soube que ela ficara desconcertada, a arma em sua nuca vacilou por um instante e ele pôde sentir um certo incômodo.
-Não percebi o quê? - A voz dela já não era tão letal.
-Você sabe com quem está se metendo? Esse homenzinho sentado aqui na frente chama-se Moisés Darmandes. É um dos ladrões mais procurados nos tempos modernos, desses que só se encontram em filmes. Acha que, por mais esperta que pode ser, conseguiria pegá-lo com tanta facilidade? Acha que uma bomba, um leão e um pouco de tinta vermelha na cabeça poderia detê-lo? - Ela não disse uma única palavra como Marcos previu, por isso ele continuou - Você pode ser incalculavelmente talentosa, mas ele é genial. E sim, isso faz toda a diferença.
-Você está blefando.
-Quem sabe? Eu posso estar te enrolando e ganhando tempo, pra tentar alguma coisa... Ou, eu posso estar falando a verdade e nós dois já estamos mortos.
-Não acredito que acha que pode inverter a situação, eu tenho uma arma na sua nuca e, se nós dois por acaso vamos morrer, eu mesma te matarei. E com prazer, devo dizer.
-Não, você não quer morrer. Você nem mesmo quer me matar. Achou que poderia dobrar um ladrão brilhante e um policial esforçado, mas só conseguiu se envolver até o pescoço.
-Você fala demais, está na hora de te calar.
-Ótimo, é uma opção que você tem. Mas como policial que deve preservar vidas, te aconselharia a escolher o melhor alvo. Não sei se percebeu o manequim na parede, quebrado. Ele não está ali por acaso. Eu apostaria que há câmeras naqueles olhos azuis de plástico. E que há uma quarta pessoa no quarto, dentro do guarda-roupa.
Um sorriso alto e longo, dessa vez sem um pingo de nervosismo, foi solto pela mulher.
-Você estava quase me convencendo. Foi realmente interessante, mas acho que exagerou.
-Não, eu não sou exagerado, nunca fui. Mas o senhor aqui cuja minha arma está em sua cabeça, ah ele é. E mais do que exagerado, ele é ousado. Olhe para o seu próprio peito.
Sem precisar olhar, Marcos sabia que os olhos dela haviam encontrado o laser vermelho que apontava direto para o seu coração.


Continua.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Mentes criminosas: Capítulo 2 - Uma voz no silêncio

Bom, finalmente saiu o segundo capítulo de Mentes criminosas! Peço desculpas pela demora, infelizmente passei por problemas de saúde. De qualquer forma, aí está! Espero que gostem.

Para quem perdeu o começo, leia. - Mentes criminosas, Capítulo 1: O quarto


Aos poucos, Marcos começou a recobrar os sentidos e a razão. O impacto inicial começou a se desfazer, de forma que ele teve condições de pensar. E de observar. A sua primeira preocupação foi com a mulher presa de cabeça para baixo, ela estava machucada em algum ponto da face e sangrava bastante. Parecia estar inconsciente.
Do lado oposto onde estava, havia uma jaula com espaço suficiente para o leão que nela se encontrava. O que diabos um leão estaria fazendo ali? Do lado esquerdo, encontrava-se o homem com a mochila, sentado na cama de casal com lençóis branquinhos e de costas para ele. Marcos apontava a arma firme para o homem, enquanto teve tempo para reparar em um manequim estragado ao lado, um guarda-roupa antigo e uma mesinha de centro.
"Senhor Moisés, levante as mãos, agora!" - O homem continuou sentado e imóvel.
Marcos manteve a sua posição e ordenou mais uma vez. A cena não se alterou.
Então, o homem começou a se mexer vagarosamente, Marcos segurou firme na arma. "Senhor, não tente nada, eu estou apontando diretamente para a sua cabeça, qualquer movimento e eu não vou hesitar em atirar!" - Moisés continuou a se mexer até que um tiro foi ouvido.
A jaula onde estava o leão se abriu com o tiro na fechadura, e o animal saltou para fora como um predador que não come há muito tempo, direto para a mulher.
Marcos correu com tudo que pôde, pisando na mesinha de centro saltou para cima com o máximo de impulso ao mesmo tempo em que tirava a faca guardada em sua perna. Com um movimento ele soltou a mulher. Sabia que a queda não seria das melhores, mas não havia o que fazer, o leão já havia saltado em direção a ela também.
Homem e animal se encontraram no ar e caíram ao mesmo tempo. O leão caiu e tombou com a faca cravada em seu pescoço, e Marcos caiu com a arma apontada exatamente na cabeça de Moisés.
"Acabou, você está preso".
Com um susto, percebeu que o homem estava com a boca tapada com fita, assim como suas mãos, inclusive a que estava com a arma apontada para um único lugar: a jaula.
Antes que pudesse tomar qualquer atitude sentiu uma arma na nuca, e uma voz feminina, calma e sexy, se fez diante do silêncio de espanto: "Nem um movimento".

Como sabem, continua na próxima semana.

domingo, 14 de março de 2010

Mentes criminosas: Capitúlo 1 - O quarto

Era o apartamento 106. Havia um certo ar de solidão naquele andar, mas nada parecia tão distante e frio quanto aquele apê.
Foi pensando nisso que Marcos Correa se permitiu a dois, talvez três minutos antes de bater.
Toc toc. Nada pôde ser ouvido. Toc toc. Nada.
"Abra, senhor Moisés, preciso falar com o senhor. Agora."
Não obteve nenhum tipo de resposta.
Tentou, talvez por um estimulo fora do campo racional a maçaneta e, pra sua surpresa, ela cedeu.
O cômodo estava bastante escuro. Parecia muito com uma sala, sim era isso mesmo, o sofá denunciara.
Olhou demoradamente tentando detalhar tudo o que a visão lhe mostrava. Ele era bom nisso, conseguia com facilidade guardar detalhadamente cenas, fisionomias e acontecimentos.
Sofá, televisão, mesinha de centro, relógio na parede, luz com ventilador, quadros, janela aberta, cortina fechada...
Não havia nada de excepcional ali. Preferiu adentrar sem ascender nenhum tipo de luz, teve a impressão que seria mais prudente daquela forma, embora estaria mais vulnerável.
Caminhou vagarosamente, os tapetes ajudaram bastante nesse propósito.
Passou pela cozinha como se ali não houvesse uma entrada, de alguma forma, sabia que não era ali onde sua experiência o levaria. Finalmente chegou ao final do cômodo, onde havia um corredor.
Um sorriso bem familiar de seus amigos, da irmã e principalmente da mãe, apareceu em sua face. Era um sorriso de quem diz, "Eu sou bom nisso". Havia uma luz que saia por entre a fresta da última porta.
Correu como se de repente o silêncio fosse dispensável, e a pressa um tesouro a ser usado.
Empurrou com toda a força que pôde a porta deixando que a luz inundasse sua visão já acostumada às trevas.
O cérebro é como um sábio que está sempre à frente do seu discípulo. Ele prepara a mente para possíveis acontecimentos, tentando sempre premeditar o que está por vir. É uma das formas mais fascinantes de nos manter vivos. Mas, quando o que nos é apresentado foge totalmente ao que foi antecipado, as dificuldades de se compreender o que está acontecendo e, naturalmente de reação, são enormes.
Marcos sentiu isso. Pela primeira vez na vida não conseguiu ter a dimensão da cena.
O quarto era inesperadamente espaçoso e pouco decorado. Tudo era muito branco e claro. Mas isso só foi sentido por ele de uma forma tangencial. O seu foco se concentrou em coisas, digamos, muito mais chamativas. Havia um leão enjaulado, uma mulher presa de cabeça para baixo e um homem de mochila.


Continua na próxima semana.

sexta-feira, 5 de março de 2010

Relógio aos tubarões

Seu Domingos era o dono do tempo. Se alguém precisasse das horas era a ele que recorriam. Nunca estava atrasado ou adiantado. Sempre sabia a hora exata.
Ele tinha uma loja de relógios, a maior da região. Trabalhava de segunda a sábado, doze horas milesimamente contadas por seus inúmeros relógios.
E não só o trabalho era cronometrado. Ele sabia que horas havia nascido, a quantas horas estava sem comer, quanto tempo levava para limpar a loja e, diziam, vejam bem, que gostaria que em sua lápide escrevessem em que horas ele havia morrido.
Acontece que o Seu Domingos precisava tirar férias, já estava atrasado para isso. É que o tempo estava curto pois ele fazia horas extras.
Até que um dia ele decidiu que estava na hora. Iria tirar duzentas e quarenta horas de férias. Iria para a Inglaterra conhecer o famoso Tower Clock.
Chegou ao aeroporto pontualmente, mas descobriu que o vôo atrasaria. Isso ele não suportaria. Conseguiu que o colocassem em outro avião, que partiria na hora certa.
Durante a viagem, houve um contra-tempo, o avião teve uma pane no sistema e caiu.
Seu Domingos acordou assustado, tirou o relógio do bolso e conferiu as horas: Quatro e sete da tarde. Olhou em volta e percebeu que estava em uma ilha. Caminhou durante uma hora e trinta e sete minutos explorando o lugar. Irritou-se.
Maldita hora que resolvera tirar férias! Maldita hora para querer chegar na hora! Se tivesse esperado o avião certo, estaria no lugar certo, e a hora, a hora que se danasse!
Nos primeiros dias ele acordava às oito, caçava peixes durante vinte e três minutos, nadava por uma hora e explorava a ilha durante nove horas e cinqüenta e dois minutos divididos em dois turnos. Depois de quatrocentos e oitenta horas, percebeu que as horas não importavam ali.
Poderia fazer o que quisesse, na hora que quisesse. Jogou o relógio no fundo do mar. Decidiu que era hora de ter todo o tempo do mundo.